segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Tubos que (tele)transportam*

As estações-tubo de Curitiba podem ser mais do que lugares de chegada ou partida. O entorno de algumas pode levar a lugares, pessoas ou situações que valem um olhar desapressado. Neste texto, apresento algumas delas na linha sentido terminal Santa Cândida - Capão Raso

Um tubo em forma de aquário, que se projeta em tom de azul cristalino num desenho quase futurista, revelando uma cidade que espera para ser consumida. Tubo que transporta, como em filmes de ficção científica, até novos mundos a serem explorados, seja por velhos conhecidos da cidade ou visitantes. Mas para onde esses tubos – rotineiros e, ao mesmo tempo, surpreendentes – podem, afinal, (tele)transportar?

Na estação-tubo Eufrásio Correia, os filtros de sonho pendurados na calçada alguns metros à frente anunciam a chegada em um pequeno universo autônomo, desconexo ao entorno. Os artesãos que fazem dali seu espaço de criação, trabalho e partilha, convivem em harmonia. O resultado disso é a diversidade de impressões em cada trabalho artesanal, capaz de provocar um sutil desvio no olhar até dos mais apressados. Nair Cardoso (Janis, para os amigos), cria e expõe ao lado do tubo. Os seus 50 anos de idade e 36 como artesã lhe renderam o título de “mãe” para muitos dos que convivem ou passam pelo local. Mulher ativa e de opiniões fortes, criou os filhos com o trabalho artesanal. Está em Curitiba há cinco anos, mas já viajou por todos os países da fronteira, mantendo-se com a arte que produz. Embora o preconceito seja motivo de tristeza, ela é convicta em afirmar que não mudaria seu estilo de vida. “As pessoas são tão inconscientes que, às vezes, vem pedir droga, como se eu fosse traficante. Eu trafico arte, é isso que eu faço. Mas não trocaria a vida que levo, jamais. Essa é minha história”. E, para os que levam alguma peça para casa, levam, também, um pedaço da história dela.

Janis: "trafico arte"

Uma estação à frente, no tubo Estação Central, a descoberta começa com o intenso movimento de pessoas e mundos que se cruzam em uma órbita precisa na rua XV de Novembro. O comércio convida os curitibanos e visitantes a consumir produtos de infinitas naturezas, enquanto diálogos se confundem e se completam no trajeto. Ao descer do tubo, além do movimento da XV, depara-se com a arte horizontal entre as esquinas. Em contraponto ao cenário estático dos edifícios, o céu desliza suave, em nuvens brancas ou cor de chuva. A arquitetura dos prédios modernos contrasta com o desenho clássico do prédio histórico da Universidade Federal do Paraná.

Em seguida, na estação-tubo Passeio Público, a sensação de teletransporte é ainda mais completa. O canto emblemático das aves exóticas, as pontes em forma de arco – como nos contos de fadas –, os balões de gás coloridos amarrados ao carrinho de pipoca e as árvores ao redor dos riachos, transmitem sensações diversas, quase sempre associadas à paz. Por isso o parque, homônimo ao tubo, atrai pessoas de distintas personalidades e idades, como Vinícius Rodrigues e seu grupo de amigos, residentes em Almirante Tamandaré. A definição do Passeio Público, para eles, é de um local “sossegado”. Quem sugeriu a visita ao parque foi Vinicius, de 15 anos, que sempre vai ao local com a família. O grupo, que costuma iniciar e encerrar o passeio no shopping, naquele dia optou por aproveitar o pedacinho de natureza encantada no centro de Curitiba.

E, para finalizar o passeio pela linha, aos amantes de boa música, há uma sinfonia de pássaros nas árvores logo em frente da estação-tubo Constantino Marochi, especialmente por volta das cinco da tarde dos dias de sol (ou, ao menos, sem chuva).

*íntegra da reportagem autoral publicada no site do jornal Gazeta do Povo em março deste ano

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